À medida que nos distanciamos de Upper Pisang, apreciamos a perspectiva lateralizada da povoação.
O seu casario malhado pela neve, como que a desafiar a povoação original disposta lá em baixo, ao longo da margem oposta do Marsyangdi.
![Lower Pisang, Circuito Annapurna, Nepal](https://www.got2globe.com/wp-content/uploads/2019/01/93ad40a9-1595-4112-b253-322288893368-1024x683.jpg)
Vista de Lower Pisang à beira do rio Marsyangdi, com a montanha Annapurna II bem acima.
Mais para a frente naquele trecho florestado do Circuito Annapurna, contornamos um meandro do rio que nos expulsa do vale amplo de Pisang e entrega a um novo desfiladeiro com visual alpino, repleto de pinheiros.
Percorremo-lo de fio a pavio. Até que encontramos novo paredão mani e, no seu prolongamento, o casal italo-hispânico que tínhamos conhecido no dia anterior: Edoardo Berto e Sara Perez.
![Meandros do Marsyangdi, circuito Annapurna, Nepal](https://www.got2globe.com/wp-content/uploads/2019/01/11bf588b-7b78-41a4-acf2-da8d686d9ffe-683x1024.jpg)
Leito escavado do rio Marsyangdi uma constante em boa parte do circuito Annapurna.
Queixamo-nos do peso excessivo que carregávamos. No seu jeito despachado, Sara avisa-nos que, nesse caso, íamos sofrer a dobrar. “Já viram o castigo que ali vem? O Josh e o Fevsi estão lá para o alto.”
Uma Ladeira Castigadora
Nem no mapa, nem no terreno. A verdade é que nos passara despercebido o declive que levava a Ghyaru, bem mais assustador que o que nos conduzira a Upper Pisang no final de tarde anterior.
![Pintura budista, Circuito Annapurna, Nepal](https://www.got2globe.com/wp-content/uploads/2019/01/8d236c35-7e58-48fd-b6c8-1b20cedc4a50-1024x684.jpg)
Pormenor de arte religiosa budista num muro de orações que antecede a subida para Ghyaru.
Edo e Sara deixam-nos entregues a um já merecido snack. Pouco depois, no seu encalço, damos com uma ponte suspensa sobre um afluente desnivelado do Marsyangdi. No lado de lá, o trilho confronta-nos com um ziguezaguear que parece desenrolar-se sem fim pela vertente da montanha acima.
Nesse momento, ainda nos passa pela cabeça voltarmos atrás, para o trilho alternativo e bem mais plano que partia da já longínqua Lower Pisang. Até que vislumbramos os corpos dos outros compinchas, bem mais para o topo.
A sua relativa iminência estimula-nos a enfrentarmos a ladeira, de acordo com um plano em que concordamos: recuperaríamos o fôlego e a postura, nem que fosse só vinte segundos no término de cada um dos zigues ou zagues.
![Bandeiras de oração em Ghyaru, Nepal](https://www.got2globe.com/wp-content/uploads/2019/01/562f3210-68c9-4ce8-996c-7ae578a6836f-1024x684.jpg)
Bandeiras de oraçao garridas e, em fundo, uma montanha majestosa dos Annapurnas.
Assim dito, assim feito. Passados quarenta e cinco minutos, voltamos à companhia de Edo e Sara, ambos ainda deslumbrados com o cenário que tinham pela frente.
Saudamo-los e partilhamos com eles a vista inacreditável. Nunca, nos dias que já levávamos de caminhada, as montanhas dos Annapurnas, nos pareceram tão próximas e tão íntimas como ali. Era, aliás, a razão porque Edo, Sara, Fevsi e Josh, tinham decidido instalar-se na primeira das guest-houses da povoação.
Juntamo-nos a eles numa deliciosa galhofa multilingue. Celebramos a conquista e almoçamos os seis sobre um terraço de madeira com vista para o panorama surreal que tanto tínhamos feito por merecer.
Por essa altura, já Josh descobrira que se esquecera do seu permit do circuito em Chame e que, por mais frustrante que lhe soasse, teria que recuar dois ou três percursos para o recuperar, a começar na madrugada seguinte.
Em solidariedade para com o alemão mas também em função da vista, os quatro companheiros decidiram pernoitar naquela mesma pousada. Nós, precisávamos de prosseguir.
![Dona de Tea House de Ghyaru, Nepal](https://www.got2globe.com/wp-content/uploads/2019/01/ff76d575-df89-44fb-bb27-bedc43f7f40e-1024x683.jpg)
Dona nepalesa de um pequeno restaurante e hotel logo à entrada de Ghyaru.
De acordo, mesmo contrariados, por volta das três da tarde, compramos uns mini-chocolates de reserva e saímos disparados para a próxima povoação no mapa.
“São cerca de duas horas. Duas, mas planas!” assim nos descreve o caminho a dona nepalesa da pousada de Ghyaru, desgostosa por ver partir fontes de lucro com que já contava.
![Yak Ru hotel, Ghyaru, Nepal](https://www.got2globe.com/wp-content/uploads/2019/01/600ba25d-7026-4990-8dad-97605cb0762e-1024x683.jpg)
Entrada para o restaurante e hotel Yak Ru, em Ghyaru.
O caminho (ainda assim) bem mais tranquilo para Ngawal
Depressa nos inteiramos de que, apesar de mais selvagem e monumental que a maior parte do trecho entre Upper Pisang e Ghyaru, o trilho não tinha, nem de perto nem de longe, tal perfil.
Incluía uma série de subidas e descidas quase sempre roubadas às encostas e que espreitavam grandes precipícios sobre o rio cavado no desfiladeiro. O Marsyangdi – nem poderia ser outro – voltava a escoltar-nos.
![Morador de Ghyaru, Nepal](https://www.got2globe.com/wp-content/uploads/2019/01/bc3f9e46-957b-4aed-85a8-a6bd57bb11d4-1024x683.jpg)
Moradora de Ghyaru carrega dois grandes cestos de caruma seca.
Durante todo o tempo, cruzamo-nos apenas com um ciclista europeu que conduzia uma BTT e com um nativo do Nepal que se apresentou como guia ou carregador, o que nos desse mais jeito. Seguiam ambos no sentido contrário.
O facto de o sol ter deixado de dar em largas secções do percurso e de suspeitarmos que o vento reforçado trazia nuvens antes retidas pelas montanhas, faz-nos acelerar o passo.
![Estupa entre Ghyaru e Ngawal, Nepal](https://www.got2globe.com/wp-content/uploads/2019/01/1921fa07-527d-4d26-b942-ade4afb0c727-1024x683.jpg)
Estupa entre a sombra e o sol poente, com a cordilheira das Anapurnas ao longe.
Com o destino à vista, as promessas fáceis e vãs do angariador à porta, convencem-nos a ficarmos na segunda das guest-houses que encontramos.
Sete horas e meia após a partida de Upper Pisang, cinco de dura caminhada, damos entrada em Ngawal, a aldeia que nos acolheria na noite que, tal como nós, já quase caia.
Mais informações sobre caminhadas no Nepal no site oficial do Turismo do Nepal.